Volte sempre

A beleza das coisa não está no tempo em que elas duram mais na intensidade com que acontece.

terça-feira, 29 de junho de 2010

DADOS DO (CRAMI)


DADOS ESTATÍSTICOS DO CRAMI 2010

Estes dados referem-se ao trabalho desenvolvido pelo CRAMI nos municípios de Santo André, Diadema e São Bernardo do Campo.

FAMÍLIAS EM ATENDIMENTO EM 2010

Tipo Violência

Jan

Fev

Mar

Abr

Mai

Jun

Jul

Ago

Set

Out

Nov

Dez

Sexual:
- Abuso

178

179

175

167

171

- Exploração

004

004

006

006

067

Física

283

274

266

265

278

Psicológica

043

043

048

047

049

Negligência

028

028

028

031

033

Outros

001

001

-

-

-

TOTAL

537

529

523

516

538



A incidência dos papéis de gênero na situação de violência doméstica contra crianças e adolescentes.

“(...) Nunca diga: isto é natural, para que nada passe a ser imutável”. Bethold Brechdt

Partindo dos dados apontados pelas pesquisas anuais dos registros de situação de violência doméstica registrados pela instituição, as mães são sucessivamente indicadas com os maiores números de autores de violências física, representando 50% das notificações deste tipo de agressão no ano de 2008 . Este resultado pode provocar um estigma com reação as mães, taxando-as como as mais “agressoras” em comparação aos pais ou outros responsáveis pela criança e/ou adolescente, podendo ser vistas as vilãs desta história. Estatisticamente este resultado está evidenciado, no entanto a prática cotidiana aliada à conexão feita à dinâmica apresentada pela sociedade em que os sujeitos estão inseridos revela diversas interfaces permeando este fenômeno, muitas delas merecendo um estudo aprofundado para outro momento. Contudo, algumas reflexões acerca deste assunto serão discorridas ao longo deste texto, num recorte sobre os papéis de gênero e a sua incidência na situação de violência doméstica contra crianças e adolescentes.

Saffioti (1987) explica que é designada à mulher a responsabilidade quanto aos cuidados e socialização dos filhos por conta de biologicamente ser capaz de gerá-los. A autora salienta que este processo é socialmente construído, não de ordem natural como está ideologicamente posto na sociedade.

Apesar de ao longo da história a mulher ter conquistado direitos a curtos passos e em virtude disto ter mudado o seu comportamento e conquistado muitos espaços, este pensamento descrito pela autora acompanha o meio social. A minoria que discorda desta afirmativa e procura escrever sua história de maneira diferente é discriminada, “taxada” e muitas vezes se sente culpada por não estar encaixada neste padrão posto que já determina a vida da mulher: crescer, aprender prendas domésticas, casar-se e ter filhos.

Um fenômeno importante a considerar é o crescimento do número de famílias monoparentais chefiadas por mulheres. De acordo com o IBGE (2000) somam 12,6% levando-se a constatar que na sociedade contemporânea além da mulher ser responsável pelos afazeres domésticos e educação dos filhos, também é responsável pelo sustento financeiro e organização da família em todos os aspectos. Observa-se que mesmo as mães que possuem um companheiro, é delegada a elas a tarefa de educar os filhos e na maioria das vezes ainda estão presentes os resquícios da sociedade burguesa em que era atribuído exclusivamente ao homem prover a família. Entretanto, na sociedade contemporânea a mulher também virou provedora, porém não foram divididas com o homem as responsabilidades com relação à prole.

Neste contexto social de desemprego, precarização do trabalho, sobrecarga de funções, não aceitação afetiva de determinado filho por vários motivos, destacando a violação de direitos sexuais e reprodutivos são fatores que permeiam o universo da mulher que podem desencadear a violência contra os filhos.

Suponha-se que por conta de tantas tarefas, dificuldades, tendo que dar conta de tantas incumbências importantes simultaneamente, aliada a questão cultural do “bater” para educar, as mães aparecem nas pesquisas como as maiores autoras de violência física. Acredita-se que elas aparecem nesta estatística por serem mais próximas da prole; por socialmente e historicamente a mulher ser incumbida de tarefa de educar e logicamente incorporar esta ideologia como verdade absoluta, sem oportunidades para questionamentos quando existe um pai para dividir as tarefas domésticas e com relação aos filhos, embora seja “obrigada” a dividir os encargos financeiros da família, ou quando não tem opção, por diversos motivos, criam os filhos sem a figura paterna.

Além de transgeracionalmente estar disseminado na sociedade a idéia de que por meio da agressão é que educa, vive-se numa época em que não há tempo para ter mais proximidade, escutar, conversar, observar. Este é um reflexo do que acontece na sociedade atual, onde o que manda é a rapidez, o imediatismo. Popularmente, os sujeitos acreditam que educar por meio do “bater”, gritar, é mais rápido e eficaz, não se deixando perceber que na maioria das situações a relação termina sendo prejudicada. E como conseqüência produz sujeitos violentos que assim se expressam nos espaços que ocupam por aprenderem que por meio de violência é se consegue o que quer, tem o respeito das pessoas.

E isto não é culpa da mulher que lidera esta estatística, sim de uma sociedade machista, opressora e desigual. Ainda é apontada como negligente quando precisa trabalhar fora e não tem um adulto em que possam confiar os cuidados dos filhos, porque as vagas em creche não absorvem toda a demanda e ainda são escassas as políticas públicas para crianças acima de sete anos e adolescentes. Aí entra o papel do Estado no cumprimento do art. 205 as CF/88: “A educação, direito de todos e dever os Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação par o trabalho” (Constituição Federal, 1988).
Entende-se que o Estado está numa esfera maior do que a família e tem a função de organizar e proteger a sociedade, ou seja, se o primeiro negligencia o seu papel, o segundo e terceiro tem limitadas condições de cumprir com a parte que lhes cabem. Neste caso, quem é o maior culpado, quem é o verdadeiro negligente?

Não se pretende neste conteúdo, justificar ou isentar as mães da sua responsabilidade quanto à prática de violência doméstica, que é uma violação de direitos sociais e como tal prevê penalidades de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e pelo Código Penal (1940), este último dependendo da gravidade do dano físico causado. Pretende-se lançar reflexões do que está por traz da aparência de uma das interfaces que permeiam o fenômeno da violência intrafamiliar, os papéis de gênero. A importância de se pensar sobre este panorama é despertar para a idéia de que todos os atores desta história são vítimas: o autor da violência apontado reproduz a violência estrutural que sofre sem perceber, terminando por acreditar que é natural. Enquanto não forem questionadas algumas “naturalidades”, sobretudo nos fenômenos sociais, nada será mudado, continuarão as reproduções de violência. Sem se perguntar os porquês, não é possível a transformação.

Vivian Souza da Rocha - Assistente Social

Referências Bibliográficas

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em: 5 de outubro de 1988. Editora Saraiva, Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. 33 ed.ed.atual.e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. ISBN 85-02-04645-4.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente, 1990.
SAFFIOTI, H. I.B. O poder do Macho. São Paulo: Moderna, 1987. p 8-9

Nenhum comentário:

Postar um comentário